Há questões urgentes, como riscos da educação domiciliar e direito ao aborto
O início de um novo governo representa uma chance enorme de pensar estrategicamente questões importantes para o país. Algumas são urgentes, outras de construção a médio e longo prazo. Na condição de diretora-presidente do Instituto Liberta de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes, gostaria de ajudar a jogar luz em questões urgentes que conversam diretamente com essa temática, apesar de às vezes não parecer.
Vamos começar com a que nós consideramos a mais importante delas: uma eventual aprovação da lei que permite a educação domiciliar. Já tivemos a oportunidade de falar sobre isso aqui neste espaço, quando o projeto de lei ainda estava em tramitação na Câmara dos Deputados. Infelizmente, a nossa voz e de tantas outras organizações não foi ouvida, e o PL 1.388/2022 foi aprovado pela Câmara em 19 de maio (como PL 3.179/2012) e está hoje na Comissão de Educação do Senado.
Nosso argumento contra a aprovação da possibilidade de os pais não mandarem os filhos e filhas para a escola é bem objetivo: a violência contra crianças e adolescentes é preponderantemente intrafamiliar. Se fizermos o recorte só dos dados de violência sexual publicados no Anuário Brasileiro de Segurança 2022, veremos que mais de 61% dos estupros registrados em 2021 foram contra menores de 13 anos de idade, sendo que 40,8% dos estupradores eram pais e padrastos; 37,2% irmãos, primos, tios e outros parentes; e 8,7% avós. Acho que são dados autoexplicativos. Se a criança não vai para a escola, a chance de ela poder contar sobre uma violência intrafamiliar, ou alguém perceber, diminui muito. A escola não é só um espaço de aprendizado formal, mas um espaço de proteção da criança.