Victoria Tauli-Corpuz recomendou que o Brasil retome a demarcação de terras indígenas e reavalie os impactos dos projetos de infraestrutura
(Rede Brasil Atual, 20/09/2016 – acesse no site de origem)
Relatório apresentado hoje (20) ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pela relatora especial sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, avalia que a situação dos povos indígenas brasileiros “é a mais grave desde a adoção da Constituição Federal de 1988”. “A impressão geral é de que o Brasil possui uma série de disposições constitucionais exemplares em relação aos direitos dos povos indígenas. Entretanto, há uma inquietante ausência de avanços para a implementação das recomendações e na solução de antigas questões de vital importância”, avaliou Victoria.
A relatora destacou os assassinatos de lideranças indígenas como um dos principais problemas no país atualmente, sobretudo por ocorrerem como forma de represálias contra a reocupação de terras ancestrais pelos povos indígenas, depois de longos atrasos nos processos de demarcação. De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), 92 indígenas foram assassinados em 2007. Já em 2014, esse número havia aumentado para 138, com o estado do Mato Grosso do Sul sendo palco do maior número de assassinatos.
Victoria recomendou ao governo brasileiro que redobre esforços para superar os conflitos quanto à demarcação de terras, principalmente nos estados do Mato Grosso do Sul, Bahia, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
“Considerando o status de marginalização dos povos indígenas, o fato de sérias violações de seus direitos ao longo das últimas décadas não terem sido adequadamente investigadas ou remediadas e a urgente necessidade de enfrentar a contínua discriminação estrutural, a relatora especial coloca particular ênfase na importância de iniciar um inquérito nacional independente e transparente sobre a violação de seus direitos”, argumentou Victoria, no relatório.
O documento menciona ainda a paralisação dos processos de demarcação de terras indígenas, os despejos e os impactos dos projetos de infraestrutura localizados no interior ou arredores de territórios, como as hidrelétricas, projetos de mineração e a instalação de linhas de transmissão, implementados sem consulta prévia aos afetados. “Considerando as alegações de etnocídio no caso Belo Monte trazidas pelo Ministério Público, extrema cautela deveria ser exercida com relação à mineradora Belo Sun e o projeto de hidrelétrica Tapajós”, defendeu a relatora.
Danicley de Aguiar, ativista da campanha da Amazônia do Greenpeace, disse esperar que o governo brasileiro atenda às recomendações da relatora da ONU e reveja a construção de barragens na Amazônia.“Esperamos que o Estado brasileiro reveja as práticas estatais e privadas que têm sustentado o retrocesso na proteção dos direitos indígenas, especialmente no que diz respeito à morosidade do processo de demarcação das terras indígenas. A construção de barragens na Amazônia se tornou um importante vetor de violações dos direitos indígenas no país, para além dos seus graves impactos sobre o equilíbrio ecológico do bioma”, afirmou.
Victoria visitou o país em março deste ano, a convite do governo brasileiro, antes da consolidação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Para ela, o atual contexto político pode piorar a situação dos povos indígenas do Brasil, ampliando as ameaças e colocando em risco os direitos constitucionais. Ela pediu que o governo brasileiro adote medidas imediatas para proteger a segurança de líderes indígenas e garanta investigações sobre os homicídios, levando os responsáveis à Justiça.