Para Janot, lei que fixa limites no percentual do fundo partidário destinado às candidatas provoca distorção e agrava desigualdade de gênero
(MPF, 27/10/2016 – acesse no site de origem)
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal (STF) em que pede a inconstitucionalidade da norma que prevê a destinação de no mínimo 5% e no máximo 15% dos recursos do Fundo Partidário destinados às campanhas eleitorais dos partidos para a divulgação da candidatura das mulheres. Para Janot, ao estabelecer limites para esse financiamento, a norma causa distorções, agravando ainda mais a desigualdade entre homens e mulheres, além de violar a autonomia partidária.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5617 foi proposta a pedido do vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, e do procurador regional eleitoral em Minas Gerais, Patrick Salgado Martins. Nela, o procurador-geral da República pede que seja concedida liminar para suspender os efeitos do artigo 9º da Lei 13.165/2015 e, no mérito, declarar inconstitucionais os limites máximo e mínimo impostos para o financiamento das campanhas de candidatas.
Segundo Janot, ao fixar o limite máximo de 15% dos recursos do fundo partidário para campanhas de mulheres, o texto prevê que os demais 85% sejam destinados às candidaturas masculinas. A medida “não apenas viola o princípio da igualdade, como, ainda mais grave, inverte o sistema de cotas eleitorais”, destaca o PGR na inicial da ação. Para ele, a norma “produz mais desigualdade e menos pluralismo na definição das posições de gênero na política – em vez de mais igualdade, como seria esperado”.
Além disso, o dispositivo inclui no montante destinado às mulheres os valores que os partidos devem destinar à difusão da participação feminina na política (previsto na Lei 9.096/1995), o que, na prática, segundo o PGR, reduz ainda mais o total disponível para financiar a campanha das candidatas. “A própria existência de disposição legal que limita a reserva de recursos para candidaturas femininas demonstra a força da cultura patriarcal brasileira, que somente será substituída por cultura igualitária e democrática se as mulheres participarem da arena política com condições reais de influenciar os destinos do estado brasileiro”, defende Janot.
O PGR também defende ser inconstitucional a definição do patamar mínimo de 5% do fundo para financiar a campanha das mulheres. Ele pede que o dispositivo seja interpretado conforme a Constituição, para ser equiparado ao patamar mínimo de candidaturas femininas que os partidos são obrigados a seguir, que é de 30% (art 10, §3º, da Lei 9.504/97). Nesse sentido, com base no princípio da proporcionalidade, Janot entende que pelo menos 30% da parcela do Fundo destinado a cada partido devam ser destinados à campanha das mulheres. Havendo percentual maior de candidatas na legenda, o mínimo de recursos alocados deverá seguir a mesma proporção.
“A reserva de vagas, como opção legislativa de materialização do princípio da igualdade, só será efetiva se acompanhada de proporcional destinação de recursos financeiros, por tempo razoável, já que mudanças sociais profundas não ocorrem em prazo curto”, defende o PGR na inicial. Segundo ele, essa reserva deve ter percentuais mínimos, proporcionais ao número de candidatas, mas nunca máximos, para garantir que elas sejam eleitas de forma a aumentar a representação feminina na política.
Autonomia partidária – Na ADI ao STF, o PGR argumenta também que o estabelecimento de limites para financiamento de campanhas femininas representa uma interferência no modo de funcionamento dos partidos, o que afronta a autonomia partidária prevista na Constituição. A norma impede, por exemplo, que os partidos dividam de forma igualitária o montante destinado às campanhas de homens e mulheres. “Tal interferência legislativa sobre o funcionamento dos partidos políticos revela-se inconstitucional, abusiva e irrazoável e excede os limites legítimos da prerrogativa outorgada ao estado para regular o processo eleitoral”, ressalta na inicial.
Ele questiona, ainda, o período fixado para a validade da norma, que abarca apenas as três eleições subsequentes à publicação da lei, que é de 2015. Para Janot, a regulamentação “protege de forma insuficiente, ineficiente e incompatível com a finalidade constitucional os direitos políticos das mulheres, pela impossibilidade concreta de alteração da realidade política brasileira, refletida nos partidos políticos, no prazo sociologicamente exíguo de cinco anos, infenso ao princípio da proporcionalidade”.