Imagine um país em que parlamentares votam no que é melhor para o povo e não para seus partidos; onde investimentos em saúde e educação só aumentam. Nesse país, empresas que pagam salários diferentes para homens e mulheres na mesma função são punidas e a licença parental é ampla e remunerada. Utopia? Nem tanto. Estudos mostram que essas mudanças acontecem quando nós ocupamos cargos na política de forma expressiva. Ao longo de 2018, Marie Claire se dedicará ao tema em todas as edições, site e redes sociais. A seguir, uma investigação sobre o que muda quando o poder se torna feminino, e os nomes que poderão fazer parte dele no Brasil
(Marie Claire, 29/01/2018 – acesse no site de origem)
Massa crítica é um termo cunhado pela física, usado, grosso modo, para designar a quantidade necessária de material para uma explosão nuclear. Num experimento em laboratório, alcança-se a massa crítica e, bum, acontece a mudança. Por sua clareza, a expressão foi usada pela sociologia nas últimas décadas. E, em 2018, deverá cair na boca das brasileiras: quando alcançam um número significativo de postos na política, as mulheres promovem melhorias não só para si próprias, mas para o país. No Brasil, onde temos apenas 10% das cadeiras do Parlamento, os passos para atingir esse patamar são ainda mais urgentes.
Um estudo feito pela ONU Mulheres divulgado no ano passado mostrou que estamos em 154º lugar entre 174 países em termos de representatividade, com 55 mulheres entre 513 deputados e 13 entre 81 senadores. “Foi uma surpresa. Na América Latina e no Caribe, onde a média de participação é de 25%, o Brasil só perde para Belize”, afirma Nadine Gasman, representante do órgão no Brasil. Pior: se continuarmos elegendo deputadas e senadoras na velocidade dos últimos anos, só alcançaremos a equidade em 2080, segundo um estudo do Banco Mundial. No Executivo, a situação é ainda mais vergonhosa: no governo federal são apenas duas ministras (Grace Mendonça, Advocacia-Geral da União, e Luislinda Valois, Direitos Humanos) entre 28. “Embora no Brasil as mulheres tenham conquistado direitos, como o voto, mais rapidamente do que em países como a Arábia Saudita, não alcançamos cargos de poder”, diz a socióloga Fátima Pacheco Jordão, fundadora do Instituto Patrícia Galvão, que promove estudos feministas. “Isso se deve ao machismo estrutural dos partidos políticos, que não permite uma renovação de perfis dos candidatos em seus quadros. Essa realidade se refere às mulheres, mas também aos negros.”
E quem perde com a falta de mulheres no poder? Não só elas, mas a democracia. Quando há um aumento de 5% no número total de deputadas e senadoras em um país, o uso da violência como arma de guerra cai cinco vezes em conflitos internacionais, segundo estudo da Universidade de Massachusetts. A pesquisa mostrou também que, quanto maior é a participação feminina no Parlamento, menos se usa a violência como arma de Estado e maior é a preservação dos direitos humanos. “Crescem ainda os investimentos em educação e saúde porque a mulher se preocupa muito mais com o impacto na vida cotidiana dos cidadãos do que os políticos homens”, diz Fátima.
A presença de mais mulheres no poder gera outro ciclo virtuoso. Quando são eleitas presidentes (o que aconteceu até hoje em 50 dos 193 países), o número de candidatas que chegam ao Parlamento sobe 6%. O contrário é verdadeiro, segundo a ONG americana One Earth Future. Quanto maior a presença delas na Câmara e no Senado, mais elas se candidatam à Presidência. Ainda sobre os ganhos democráticos, elas também são mais propensas a levar discussões que sejam interessantes para as nações e não apenas para seu partido – nada mais bem-vindo em tempos de radicalismo e polarização. Nos EUA, por exemplo, foi um grupo de senadoras republicanas que deixou as diferenças para abrir diálogo com democratas e fazer avançar pautas de interesse nacional quando as taxas de aprovação de projetos não chegavam a 20%, em 2013. As primeiras a topar a aliança foram mulheres. Entre os ganhos diretos, pode-se citar o fato de que na Inglaterra de Theresa May, com 32% de mulheres no Parlamento, aprovou-se um projeto de lei que prevê que empresas com mais de 250 funcionários tenham suas folhas de pagamento fiscalizadas para evitar diferenças salariais de gênero. E as licenças parentais são mais comuns em países nórdicos – na Suécia, elas são 44% do Legislativo.
No Brasil, os partidos políticos são obrigados a apresentar 30% de candidaturas femininas. Para cumprir esse objetivo, promoveram candidatas fantasmas, que não receberam um voto sequer nas últimas eleições. Por isso, começamos a levantar os nomes que dominarão o cenário neste ano.