Segundo um estudo do Pew Research Center sobre o assédio online, 53% das mulheres de 18 a 29 anos já receberam uma “dick pic” em algum momento de sua vida
(El País, 09/10/2019 – acesse no site de origem)
Se você é uma mulher, é altamente provável que em algum momento de sua vida tenha recebido a foto de um pênis no seu celular. Na melhor das hipóteses, a fotografia terá sido pedida, apreciada e desfrutada por ambas as partes. Na pior, você provavelmente recebeu uma foto de um pênis qualquer, sem esperar por isso. De acordo com um estudo do Pew Research Center sobre assédio online, 53% das mulheres entre 18 e 29 anos receberam uma dick pic em algum momento da vida. A mesma tecnologia que nos permitiu fazer sexo com alguém que esteja a mais de 3.000 quilômetros de distância também conseguiu mudar a imagem do tarado mostrando seu pênis perto da porta das escolas, pois agora ele nem se esconde mais em algum canto. Às vezes, eles têm rosto, nome e sobrenome e podem até divulgar seu número de telefone —via WhatsApp— e seu local e cargo no trabalho.
A reação a uma fotografia não pedida de um pênis geralmente é de surpresa, incredulidade, medo ou irritação. Algumas mulheres chegam até a rir disso por causa do grotesco da situação. Mas a grande maioria não pode evitar olhar para a tela do seu celular com desgosto e se perguntar o que diabos leva um homem aparentemente normal a tirar uma foto de seu membro e enviá-la com tanto descaramento.
Recentemente, The Journal Of Sex Research chegou às respostas. Em um estudo intitulado I’ll show you mine and you’ll show me yours (mostro o meu e você mostra o seu, na tradução livre em português), são exploradas as motivações por trás do envio não solicitado de imagens das genitálias, bem como a personalidade e características sexuais de homens que enviam essas fotos em comparação com os que não fazem isso.
No total, 48% dos homens admitiram ter enviado uma foto de seu pênis em alguma ocasião, sem o consentimento da outra pessoa. Em relação à motivação, a maioria dos sujeitos deste estudo reconheceu que envia essas fotografias na esperança de receber em troca outras do mesmo tipo. No entanto, outros participantes admitiram, dando amostras de misoginia, que o que os estimulava era a resposta negativa das destinatárias. O sentimento de poder e controle sobre a reação da outra pessoa se tornavam fatores condicionantes para essa troca: “O envio de uma foto do pau me dá uma sensação de controle sobre a pessoa para quem envio”, admitiu um dos entrevistados.
De acordo com o estudo, 82% dos entrevistados revelaram que sua intenção final era fazer a mulher que recebeu a foto se sentir excitada. No entanto, falhavam ao reconhecer a importância do consentimento na hora de trocar fotos. A máxima “não há mal nenhum em tentar”, que tanto favorece o assédio às mulheres na cultura machista, parece encontrar neste estudo bases científicas.
A prova desse narcisismo é que muitos homens disseram sentir-se tão orgulhosos de seu membro que não puderam evitar compartilhá-lo com desconhecidas.
Para surpresa de poucas, o perfil do homem que envia esse tipo de foto mostra altos níveis de narcisismo, além de respaldar exemplos de machismo ambivalente e hostil em comparação com os homens que não enviam fotos de seus órgãos genitais a desconhecidas. A prova desse narcisismo é que muitos homens disseram sentir-se tão orgulhosos de seu membro que não puderam evitar compartilhá-lo com desconhecidas.
Quais são as soluções possíveis?
Recentemente, como relatou o jornal The Guardian, a webdesigner Kelsey Bressler solicitou fotos de pênis a seus seguidores no Twitter. Não era uma brincadeira. Ela está desenvolvendo uma versão beta de um filtro que permitiria interceptar 95% das fotos de conteúdo sexual —mais especificamente, do pênis— que chegam por mensagem privada e eliminar e bloquear quem as envia, o que evitaria para muitas mulheres surpresas desagradáveis na hora do café. O filtro, ainda em desenvolvimento, foi criado com imagens de filmes pornográficos e nesta nova fase deve ser testado com fotografias reais.
Bressler está buscando uma solução para um problema sofrido por muitas mulheres, ao qual os setores de tecnologia não dão importância suficiente: que o fato de não ser cara a cara não significa que não seja assédio e que a existência de ferramentas que permitam silenciar e bloquear quem envia esse tipo de conteúdo não impede que muitas mulheres tenham que ver antes o conteúdo.
Aplicativos como Twitter, Instagram e WhatsApp já mostram borradas as fotografias enviadas por destinatários desconhecidos: excluí-las diretamente para que nenhuma mulher tenha de vê-las e até mesmo bloquear esses usuários que só recorrem às redes para enviar esses conteúdos, novamente como a versão digital do tarado na porta da escola, faria da Internet um lugar muito mais amigável para pelo menos 53% das mulheres.
Por Beatriz Serrano