Como atitudes diárias ajudam a reforçar a cultura machista e a violência contra a mulher

13 de fevereiro, 2017

“Discutir masculinidade significa romper com um padrão FIXO, LIMITADOR e PRÉ- MOLDADO do que é ser homem”, diz cartilha da Defensoria Pública.

(HuffPost Brasil, 13/02/2017 – acesse no site de origem)

A Defensoria Pública de São Paulo lançou a cartilha Vamos falar sobre masculinidade?, com orientações sobre como combater o machismo e esclarecimentos sobre a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006).

De acordo com a coordenadora auxiliar do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, Yasmin Pestana, o objetivo da campanha é que os homens reflitam sobre atitudes cotidianas.

A ideia de que existe uma padrão hegemônico de masculinidade que aprisiona os homens está relacionado ao machismo. O que a cartilha pretende debater é que existem várias formas de ser homem e outras formas de masculinidades que não estejam relacionadas a padrões machistas.
Defensora pública Yasmin Pestana

Serão disponibilizadas 10 mil cópias em todas as unidades do órgão e também no site da defensoria. O órgão também fará duas rodas de discussões sobre gênero. Uma nesta terça-feira (15), das 19h às 21h30 na Defensoria Pública em Santo André. E outra nesta quarta-feira (16), das 17h às 19h30 na Defensoria Pública em Ferraz de Vasconcelos.

No início da publicação, vem o questionamento sobre o que é ser homem e as brincadeiras de infância.

Para as meninas brinquedos de cozinha, bonecas, fantasias de princesas etc. Para os meninos, bola, skate, armas de brinquedos, espadas etc (…) Por que os homens têm que mostrar coragem e força enquanto as mulheres, fragilidade e dependência?
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

Em seguida, a cartilha apresenta ideias ligadas à feminilidade, como passividade, sensibilidade, compreensão e delicadeza. E frases como “meninas brincam dentro de casa”, “mulheres são dramáticas e choronas”, “mulheres possuem TPM, por isso, são descontroladas”.

E também conceitos relacionados à masculinidade, como agressividade, dominação, insensibilidade. Além de expressões como “homem que é homem não chora” e “o homem é o chefe da família.

Para depois questionar o valor dado a essas características.

Na medida em que as características femininas são vistas como inferiores, se algum homem aparentar qualquer traço desse tipo, é tratado com inferioridade pelos outros. Por exemplo, “Mulherzinha” é um xingamento que, desde pequenos, homens que demonstram sensibilidade ouvem dos demais.
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

Discutir masculinidade significa romper com um padrão FIXO, LIMITADOR e PRÉ- MOLDADO do que é ser homem. O mesmo se aplica quando se discute feminilidade. O que se pretende, portanto, é dar liberdade para que as pessoas possam sair das “caixinhas” dos comportamentos pré-determinados para homens e para mulheres.
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

A publicação dá exemplos como não dizer que um homem é menos homem porque sua esposa ganha mais do que ele, não julgar a masculinidade de um homem que permite que sua esposa saia sozinha ou não dizer que é conduta de “mulherzinha”, um homem gostar de assistir um filme romântico.

Muitas condutas tidas como tipicamente “masculinas” são reflexo do machismo. Mas, o que é machismo? Machismo é toda forma de discriminação às mulheres, que tenha como objetivo inferiorizar, controlar e desqualificar uma pessoa pelo simples fato de ser mulher.
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

A cartilha lembra que meninos são ensinados a impor suas vontades por meio da força e que, segundo o Mapa da Violência de 2015, 94,2% das vítimas de homicídio por armas de fogo no País, em 2012, eram homens, sendo que 59% possuíam entre 15 a 29 anos.

E como essa educação está ligada à violência contra a mulher, que costuma ser vítima dentro de casa.

Se o homem aprendeu a ser agressivo e violento quando criança, se é agressivo e violento na rua, as chances desse e comportamento se repetir em casa são enormes.Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

A publicação ressalta que as vítimas de violência doméstica majoritariamente são as mulheres agredidas pelos maridos, companheiros, namorados, irmãos etc. Das mortes violentas de mulheres, 50,3% são cometidas por familiares. Desse total, 33,2% são parceiros ou ex-parceiros.

O Brasil é o quinto país mais violento para mulheres em um ranking de 83 nações que usa dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em média, 11 mulheres foram assassinadas no Brasil todos os dias entre e 2003 e 2013.

Segundo a pesquisa “Violência contra a mulher: o jovem está ligado?”, feita pelo Data Popular, em parceira com o Instituto Avon, em 2014, 51% já sofreram ameaças, foram seguidas pelo ex, ou este ficou enviando mensagens ou ainda espalhando boatos sobre a mulher.

De acordo com o Mapa da Violência 2015 – Homicídio de Mulheres, quase metade das entrevistas declararam que tiveram que tomar alguma atitude para cortar contato com o ex, incluindo deixar de freqüentar lugares onde iam regularmente, mudar o número do celular, parar de usar redes sociais e até mesmo mudar de telefone residencial ou endereço ou local de trabalho. Apenas 2% declaram ter registrado boletim de ocorrência.

E mais uma vez, a cartilha aproxima casos graves de atitudes cotidianas.

O controle das ações e das condutas das mulheres por seus companheiros também é uma forma da violência doméstica (…) Essas atitudes são realizadas por meio de violências verbais, psicológicas, morais e patrimoniais que, mesmo quando realizada com a justificativa de que é “por amor”. Por exemplo: “não quero que use essa roupa, porque eu quero te proteger e cuidar de você.
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

Em seguida, a publicação conta a origem da Lei Maria da Penha, criada a partir do caso de Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu duas tentativas de assassinato por parte de seu companheiro e, por consequência dessas agressões, ficou paraplégica. E busca acabar com mitos sobre a legislação.

A importância da aprovação da Lei nº 11.340/06 foi a contribuição ao debate sobre violência doméstica, que se espalhou pelo país, mostrando a gravidade e a invisibilidade de uma violência que até então não era conhecida ou percebida como tal. Diferente do que muitas pessoas pensam, a Lei não tem como objetivo principal prender os homens.
Cartilha “Vamos falar sobre masculinidade?”

E detalha os tipos de violência previstos na Lei: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. A defensoria também explica que as mulheres podem solicitar medidas protetivas, como afastamento do lar do homem autor da violência, proibição de contato por qualquer meio (celular, internet etc), suspensão de visitas, entre outras.

A cartilha mostra ainda que a Lei Maria da Penha prevê a criação de grupos de reeducação para homens autores de violência doméstica, em que são discutidos temas relacionados ao cotidiano dos homens.

Ao final, a publicação dá sugestões de como os homens podem combater a violência contra a mulher, como conversar com amigos e familiares homens se perceber que estão envolvidos em alguma situação de violência doméstica e acabar com a divisão de tarefas e de tratamentos desiguais a meninos e meninas nos espaços familiares.

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