Número de propostas apresentadas no primeiro semestre para combater a violência em 11 estados e no Distrito Federal é 53,6% maior que o de discutidas em todo o ano de 2015
(O Globo, 22/07/2019 – acesse no site de origem)
Ao mesmo tempo em que o Congresso Nacional começou a analisar o pacote anticrime enviado pelo ministro Sergio Moro, o interesse de deputados estaduais pela segurança pública cresceu no país. Levantamento feito pelo GLOBO aponta que o número de projetos apresentados no primeiro semestre para combater a violência em 11 estados e no Distrito Federal é 53,6% maior do que as propostas discutidas em todo o ano de 2015, primeiro ano da legislatura passada.
Os locais escolhidos são aqueles entre os piores índices de criminalidade em números absolutos, segundo o último Atlas da Violência. A quantidade de propostas sobre segurança saltou de 235, quatro anos atrás, para 361. O Rio de Janeiro aparece como o estado campeão de projetos apresentados — foram 97 nos primeiros seis meses do ano contra 58 durante todo o ano de 2015.
Há ideias que tratam diretamente do combate ao crime, como a criação de regras para a utilização de drones em investigações ou a obrigatoriedade de equipamentos de reconhecimento facial em todas as praças de pedágio do estado. Também existem propostas que atendem a interesses das corporações, como a que exige uma unidade de saúde mental em cada batalhão e de um programa chamado “Segurança e saúde no trabalho dos agentes de segurança pública”. Algumas das ideias foram aprovadas no primeiro semestre no Rio, como a possibilidade de contratação de policiais civis aposentados para o quadro administrativo de delegacias.
Presidente da Comissão de Segurança Pública e Assuntos de Polícia da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) entre 2015 e 2018, a deputada Martha Rocha (PDT) credita o aumento à importância dada pelos eleitores às questões de segurança na última disputa.
— Mais do que nunca, a segurança foi um tema essencial para as eleições do ano passado. Como foi bastante decisiva, influencia diretamente no perfil dos projetos apresentados — diz a parlamentar.
Pelo Brasil, os deputados estaduais que assumiram seus cargos este ano têm mostrado preocupação com a violência dentro de escolas, propondo instalação de câmeras e detectores de metais para tentar evitar crimes como o massacre de Suzano, que terminou com dez mortos em março, depois que dois atiradores entraram num colégio público de São Paulo. Nos 11 estados analisados, há ao menos 52 proposições para aumentar a segurança dentro de colégios.
Entre os textos, há projetos de monitoramentos das salas de aula por câmeras de segurança, uso de detectores de metais nas instituições e instalação de fechaduras com sistema de abertura interna. Também há propostas para tornar obrigatória a presença de seguranças ou de policiais armados nos colégios.
O fato de a violência ser vista como um problema “real e concreto” pela maior parte das pessoas ajuda a explicar o aumento de propostas, segundo o gerente do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Segundo ele, apesar da polarização político-ideológica, é consenso que a sociedade “vive uma situação crônica e insustentável no campo da segurança pública”. Ainda assim, diz ele, há outros fatores para justificar o crescimento.
— Há um fenômeno que é a participação cada vez maior de pessoas ligadas à segurança se candidatando a cargos eletivos, levando à formação de bancadas da bala. Esses candidatos policiais muitas vezes se associam a um discurso mais de endurecimento penal — afirma Angeli.
Violência contra a mulher
A cada dez propostas analisadas no levantamento, pelo menos três falam sobre segurança da mulher. Há, por exemplo, proposições que tentam facilitar a matrícula em escolas públicas de filhos de mulheres vítimas de violência doméstica ou que impedem condenados na Lei Maria da Penha de assumirem cargos públicos. Aparecem, em vários estados, projetos para instalar “botões do pânico” em ambientes públicos, a fim de permitir que mulheres alertem as autoridades quando se sentirem ameaçadas.
Para a deputada distrital e procuradora da mulher da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Júlia Lucy (Novo), a pauta nas assembleias regionais é um reflexo do elevado número da violência contra a mulher no Brasil. Houve um crescimento de cerca de 30% no número de mulheres assassinadas entre 2007 e 2017, de acordo com o último Atlas da Violência. Ao todo, 4.936 mulheres foram mortas no último ano analisado pela pesquisa, uma média de mais de 13 por dia.
— É um assunto que realmente machuca a sociedade, então fizemos um esforço concentrado para aprovar projetos voltados a essa linha — afirma Lucy.
O tema de armas, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro, quase não aparece nas assembleias e representa 4,7% das proposições sobre segurança pública. São Paulo é o estado com mais projetos de lei sobre o tema. Dois deles, ainda em tramitação, pedem a isenção de ICMS na compra de armas de fogo, munições e equipamentos por agentes de segurança.