Caso ocorre em Pires do Rio e Santa Isabel, com duas postulantes em cada. Eleitores dizem que, independente do sexo, vale capacidade e honestidade.
(G1, 14/09/2016 – acesse no site de origem)
Dois dos 246 municípios goianos terão uma disputa exclusivamente feminina para as prefeituras. Em Pires do Rio, na região sul do estado, e em Santa Isabel, na região central, somente mulheres, sendo duas em cada cidade, concorrem ao cargo.
As postulantes ressaltam que não veem diferença por enfrentar candidatas do mesmo sexo e revelam que recebem apoio total e irrestrito dos maridos e filhos, fator considerado preponderante para um bom desempenho na campanha. O eleitorado vê o cenário com bons olhos, mas avalia que, independente do sexo, é preciso ter capacidade e honestidade para governar.
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Curiosamente, as disputas nas duas cidades colocam frente a frente os mesmos partidos e tem homens como vices. Em Pires do Rio, onde há atualmente pouco mais de 22 mil eleitores segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a atual administradora, Cida Tomazini (PSDB), está na disputa pela reeleição bem como pelo seu quarto mandato. Para a paulista, que tem 61 anos e vive há 34 anos em Goiás, disputar as eleições somente com mulheres não é uma situação tão fora do comum.
“Acredito que é uma coisa normal. Tinha nomes de homens para disputar, mas sai por um lado e minha concorrente por outro. Isso é normal hoje, as mulheres tem que participar na política. Na primeira vez que fui eleita, em 2001, era mais inédito. Não tinha prefeitas nessa região. Não acho nada de muito extravagantes. Mulheres estão na política e participando ativamente”, diz.
A candidata, que tem formação na área de educação, mas pouco atuou nela, afirma ainda que vê como qualidade inerente às mulheres na política o fato de não ir “com tanta sede ao pote”, diferente dos homens que são “mais atirados”. Essa situação, explica, a torna mais capacitada para enfrentar a vida pública. Casada e mãe de quatro filhos homens, ela destaca o valor da família.
“Os filhos têm um pouco de restrição, a gente sente. Mas acabam apoiando, ajudando. O marido me dá total apoio, inclusive financeiro, ele sempre nos ajudou. A gente tem todo o apoio da família. Um político sem isso é muito complicado. Família é a base de tudo”, pondera.
A concorrente da oposição é a vereadora Cleide do Gullas (PP), de 55 anos. Nascida em Pires do Rio, ela vê a possibilidade de concorrer a eleição nesta circunstância como uma “honra”, pois salienta que a participação feminina na política anda é pequena.
“Entendo que é uma valorização dentro da democracia política em um país onde poucas conseguem alcançar este espaço. Para mim é a honra estar disputando essas eleições com uma outra mulher, pois tenho em mim a responsabilidade de representar também homens, crianças e mulheres”, pontua.
Professora e comerciante antes de entrar para a vida pública, Cleide incorporou o nome da sua antiga lanchonete ao seu, pois sempre foi conhecida assim na cidade. Ela diz que entrou na política para ajudar seu povo a ter um lugar melhor para se viver e também conta com a ajuda da família para buscar a vitória.
“Não vejo dificuldade nenhuma pelo fato de ser mulher, principalmente em uma cidade onde não há esse preconceito. Recebo total apoio da minha família, marido e filhos. Meu companheiro é meu esteio, me dá total apoio” elogia.
Santa Isabel
No pequeno município, apenas 3,2 mil eleitores irão às urnas, conforme o TSE. Com dois mandatos como vereadora e outros dois como vice-prefeita, incluindo o atual, Cássia Dourado (PSDB), de 45 anos, busca ocupar o cargo máximo da administração municipal pela primeira vez. Se classificando como uma política que gosta de “planejar e organizar” o que faz, ela acha “normal” disputar a eleição somente contra outra mulher.
“Uma candidatura, independente da forma que se concretize, é democrática e natural os dois grupos terem escolhido nomes femininos. O meu vice e o dela são homens. Hoje as mulheres já conquistaram seu espaço. A gente ainda e encontra uma barreira por ser mulher, mas vejo que as mulheres, a cada dia que se passa, estão lutando e conseguindo os espaços”, pontua.
Gestora pública formada, ela afirma que “faz o que gosta” e que se sente bem em fazer algo pelos outros. Casada e mãe de dois filhos homens, ela elogia o marido e diz que toda família sempre a acompanha na vida política.
“Eles gostam demais, o apoio incondicional. Meu marido esteve e está sempre do meu lado. Tenho alicerce não só dele como dos meus dois filhos. Sempre abraçaram a campanha e alavancam junto comigo. Minhas vitórias são de todos. Apoio total”, afirma.
Do outro lado, Eumi (PP), pensa de forma semelhante. Professora aposentada, a candidata de 57 anos é vereadora em seu primeiro mandato e diz que todos têm as mesmas possibilidades, “tanto a mulher quanto o homem”. No entanto, ela diz que há diferenças na forma como ambos governam.
“A mulher vê muito as questões mais funcionais, mais pormenores, que às vezes o homem não tem um grande interesse. O olhar dele é voltado para a amplitude. A mulher parte do princípio que tudo quem ter uma base e lapidando isso. Mulher vê muito detalhes e prioriza questões menores que é assim que chega lá em cima”, avalia.
De “berço político”, ela viu o pai ser vereador por quatro mandatos e ainda vice-prefeito uma vez. Assim como as outras três candidatas, ela encontra dentro de casa o arrimo para lutar pela vitória.
“Sou casada e tenho três filhos. Meu esposo é meu braço direito, uma pessoa de uma capacidade extrema e que me apoia muito, assim como meus filhos. É uma família voltada para doar à sociedade o que podemos fazer”, salienta.
População apoia, mas cobra honestidade
Para os moradores de Pires do Rio, ter duas mulheres disputando à prefeitura é algo elogiável. No entanto, alguns deles estão desanimados com a situação política em geral, independente do sexo dos candidatos.
“Para mim, não tem diferença. Se não existisse corrupção, qualquer um poderia se candidatar. Basta ser capacitado, não querer se corromper”, opina o comerciante Mariogênio da Silva.
Já a professora aposentada Divina Helena de Alcântara acredita que as mulheres administram melhor que os homens. Ela diz, no entanto, que apesar de algumas quererem mudar os rumos políticos, o atual cenário muda a maioria. “O problema hoje é a corrupção. Política hoje virou trabalho, é só dinheiro”, lamenta.
O pedreiro Ricardo Henrique também gosta da composição com duas mulheres na disputa e vai além: crê que estamos na “era” delas. Para o trabalhador, as mulheres são até menos fáceis de corromper.
“Hoje temos mulheres delegada, juíza, promotora e até política. Elas administram melhor, tem mais malícia e são mais sensatas. O homem é cruel”, pondera.
Avanço feminino lento
Segundo Denise Paiva, doutora em ciência política, a situação mostra que o número de mulheres na política vem aumentando, mas ainda é um movimento lento quando relacionado à quantidade de homens no setor. “A participação das mulheres em diferentes esferas de poder no Brasil ainda é muito baixa. E quanto maior o cargo, menos mulheres. Tanto que elas se concentram mais nas eleições municipais”, explica.
Ela destaca que vários fatores podem ser preponderantes para esse panorama, desde a dificuldade em conciliar a vida política com a familiar, passando por dificuldades criadas pelos próprios partidos para lançar postulantes do sexo feminino até chegar em questões históricas e culturais.
Para Denise, é comum que as mulheres entrem na política por algum tipo de influência doméstica. Coincidentemente, das três candidatas em questão, três tem raízes políticas dentro da própria família.
“No âmbito municipal e no interior essa questão é mais forte. Elas se sobressaem de alguma forma pelo fato de já ter sido primeira-dama ou o pai já ter sido eleito vereador, por exemplo. De alguma forma, isso pode ser uma porta de entrada delas na política”, destaca.
Sílvio Túlio